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crônicas do cotidiano

Não são só os livros que estão sendo censurados

I  Texto: Nanda Guimarães
    Ilustração: Janaína Esmeraldo

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Era um aperto no peito, meio sem jeito, a posição na cadeira não encaixava, as mãos precisavam de mais espaço que o habitual.

Nesse momento o mundo estava no mudo. Eu, em absoluto silêncio.

O assunto foi censurado. Não era hora de falar disso ou daquilo com meus filhos. Isso, eu ouvi.

Como não era hora? Então eles podem ser bombardeados por notícias falsas, por teorias conspiratórias, todo tipo de abuso, mas não podem consumir sobre violência sexual num livro? Podem consumir livremente conteúdo sem regulação nas redes, mas não devem ter contato com Literatura que fala sobre aborto ou sobre drogas? Eram tantos dedos apontados pro lugar errado que eu não conseguia acreditar...

Enquanto nossos filhos são expostos a todo tipo de violação na internet, escritores são silenciados nas editoras, nas escolas, fruto do conservadorismo seletivo dos pais. Se não bastasse o desconforto que senti nessa reunião de pais, gritava em mim a desesperança na minha maternidade.

Como eu posso ser a mãe que me proponho cercada pelo julgamento que assola minha criação? Questionei, sem sucesso. Argumentei, sem ao menos ser ouvida.

Na verdade, o silenciamento está justamente no barulho que as pessoas “de bem” são capazes de fazer.

A minha voz dissonante nem chegou naqueles ouvidos.

Interessados mais em caber nos padrões do que nos próprios filhos, aquelas pessoas eram o retrato da nossa sociedade. Adoecida, desinformada, querendo andar pra trás e não ver. Inocência minha me surpreender quando um pai regurgitou “eu pago, tem que ser do meu jeito”.

 

Sai desolada. Ferida. O meu dia 22 de agosto de 2024 tinha gosto de 28 de dezembro de 1968. O ato institucional travestido de reunião de pais interessados.

 

Caber. Se encaixar. Fazer parte.

Pertencer.

 

Eu queria isso? Ensino isso para os meus adolescentes?

 

Não são as perguntas certas.

 

O mundo diz que é preciso, o tempo todo, ser aceito.

 

Eu, adulta, estava lá questionando o que dá pra ser dentro dessa bolha. Meus filhos se perguntam a todo instante, em silêncio, se estão sendo adequados para os seus.

 

Nós queremos ser aceitos. Mas a que custo?

Ser palatável, não desagradar, concordar. Andar igual, falar a mesma língua, vestir idem. Qualquer discrepância nos afasta da maioria e nos torna alvos.

 

Pensei mais uma vez na censura.

 

Censura de ser o que se é.

 

Quantas vezes nos silenciamos para não fugir do padrão? Quantas fomos silenciados para manter a ordem?

Não são só os livros que estão sendo censurados, somos nós, seres humanos, que estamos

sendo tolhidos, amassados, dobrados para caber no modelo.

 

Não pense, não experimente, não ouse, não seja. Ser você pode custar caro.

Você também está disposto a pagar esse preço ou só a mensalidade?

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Eu sou a Nanda, mulher, mãe, escriba em desenvolvimento, contadora de histórias, caçadora de estrelas, apoiadora de mulheres, entusiasta da vida e do amor, das miudezas, dos sentimentos que viram palavras. Sou a pessoa por trás do Instagram @palavraemprosa e me aventurei na coragem pra colocar na pontinha dos dedos o que pulsa aqui dentro.

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Faço desenhos, zines e quadrinhos sobre as aventuras da vida real. Curso Artes Visuais na UFPE e gosto de inventar zines de dobraduras e fazer quadrinhos autobiográficos como memória e registro. Publico textos e desenhos na newsletter Cabelo-nuvem e no perfil @cabelonuvem no Instagram

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